Pioneiros da nanotecnologia: uma breve história de nanotubos de carbono e grafeno

Recentemente publiquei na Ciência Hoje um artigo contando um pouco da história do grafeno, e de como seu desenvolvimento iniciou-se muito antes do prêmio Nobel de 2010. Em função das restrições de tamanho da revista, o texto ficou bastante resumido. Aqui apresento uma versão expandida do texto, com mais detalhes técnicos e que engloba também a descoberta dos nanotubos de carbono.

As propriedades superlativas de nanotubos de carbono e grafeno são amplamente conhecidas por qualquer pessoa minimamente interessada em ciência e tecnologia. Possuem propriedades mecânicas superiores a qualquer material que se conheça, ao mesmo tempo que são extremamente leves com uma fração do peso de qualquer metal. Suas estruturas podem ser finamente ajustadas, de maneira a conduzir eletricidade e calor melhores que prata e cobre, ou a serem os melhores isolantes elétricos e térmicos que existem. Nanotubos de carbono podem ser organizados de maneira a serem a cor preta absoluta e absorverem 100% da luz incidente sobre eles, enquanto o grafeno pode ser completamente transparente e ser usado na fabricação de telas sensíveis ao toque. E ainda há o campo do armazenamento de energia em baterias e supercapacitores, onde o grafeno é o principal candidato a revolucionar as tecnologias de mobilidade na eletrificação dos meios de transporte. Todas essas características e potenciais de aplicação, fazem com que esses nanomateriais de carbono ocupem hoje um papel central no interesse da comunidade científica e no desenvolvimento tecnológico. Entretanto, assim como muitas outras áreas da ciência e tecnologia, a contextualização histórica que envolve a descoberta, estudo e desenvolvimento desses materiais tem sido ignorada nas últimas décadas. A visibilidade e alcance de publicações científicas recentes de alto impacto, e o contexto geopolítico internacional dos anos de 1950-1980, fizeram com que alguns trabalhos pioneiros e relevantes na descoberta desses nanomateriais tenham sido relegados ao esquecimento. Apesar do que diz a introdução da maioria dos textos acadêmicos e de divulgação científica sobre nanotecnologia no Brasil e no mundo, não, os nanotubos de carbono não foram descobertos por Iijima em 1991 e o grafeno não foi descoberto por Geim e Novoselov em 2004. Estes trabalhos, apesar de toda a relevância que possuem, não foram os pioneiros no estudo desses materiais. Visando um pouco de justiça histórica, este texto tem como objetivo resgatar alguns dos trabalhos pioneiros na área, que merecem crédito por terem aberto os caminhos que levaram ao desenvolvimento da nanotecnologia moderna. 

Nanotubos de Carbono – pioneirismo da ciência soviética ignorado pelo mundo ocidental

Os nanotubos de carbono foram observados pela primeira vez por dois cientistas Russos em 1952. L. V. Radushkevich e V. M. Lukyanovich estudavam a decomposição de monóxido de carbono sobre ferro, e através de microscopia eletrônica, obtiveram a primeira evidência experimental de estruturas de carbono de tamanho nanométrico e natureza tubular.

Primeira imagem de microscopia eletrônica de transmissão mostrando estruturas de carbono de tamanho nanométrico e característica tubular [1].

Entretanto, em 1952, o contexto geopolítico internacional não era nada favorável a que o trabalho fosse difundido no ocidente. Em plena Guerra Fria, Radushkevich e Lukyanovich publicaram seus resultados em russo, no Zhurnal Fizicheskoi Khimii — Jornal de Físico Química da Rússia [1]. As limitações impostas pela “cortina de ferro”, assim como as dificuldades inerentes ao idioma, fizeram com que o trabalho caísse no esquecimento no mundo ocidental.

Poucos anos depois, em 1958, Mats Hillert e Nils Lange publicaram um trabalho entitulado “A estrutura de filamentos de grafite” [2], no Jornal de Cristalografia (Zeitschrift fur Kristallographie). Publicado em inglês, mas em uma revista alemã,  o trabalho teve um pouco mais de reconhecimento se comparado ao de Radushkevich e Lukyanovich, mas ainda assim muito menos do que talvez devesse. Neste trabalho eles analisam filamentos de grafite obtidos pela decomposição do gás heptano, aquecido a 1000 ºC sobre substratos de ferro. As imagens de microscopia eletrônica mostram a presença de filamentos tão finos quanto 10 nm, arranjos de nanotubos enrolados em geometria espiral, além de tubos com os canais centrais fechados na estrutura hoje conhecida como “bambu”. Além disso, Hillert e Lange utilizaram difração de raios-X pra determinar que os filamentos eram construídos a partir de estruturas lamelares de grafite dobradas em cilindros.

Nanotubos de carbono observados por Hillert e Lange em 1958. Observam-se estruturas de tubos com paredes do tipo “bambu”, onde o canal é segmentado com partes fechadas [2].

Um artigo publicado recentemente [3], trouxe a público um outro trabalho pioneiro na história dos nanotubos de carbono. Também em russo, o trabalho foi publicado em 1982 por um grupo de cientistas Ucranianos, liderados por A. M. Nesterenko [4]. O trabalho traz um nível de detalhamento e profundidade acerca dos nanotubos de carbono superior a qualquer trabalho publicado até então. Além de imagens de microscopia eletrônica de transmissão onde se observam claramente os filamentos de carbono com canais ocos em seu interior, o grupo Ucraniano analisa os filamentos por difração de raios-X e sugere que devem ser formados por “redes hexagonais monoatômicas de grafite”. Os autores foram além, especulando que as redes monoatômicas de grafite poderiam se enrolar de diferentes maneiras, dando origem a “tubos cilíndricos cristalinos” de diferentes características, o que hoje conhecemos como quiralidade.

Artigo do grupo Ucraniano liderado por A. M. Nesterenko, publicado em 1982. As imagens de microscopia de transmissão mostram claramente a presença de filamentos “ocos”. A partir de dados de difração de raios-X os autores sugerem modelos para a formação de nanotubos de diferentes estruturas, o que hoje conhecemos como quiralidade [3,4]. 

Assim como Radushkevich e Lukyanovich, o trabalho de Nesterenko também é completamente desconhecido da comunidade científica internacional. Seja pelo idioma pouco acessível a cientistas ocidentais ou pelas questões geopolíticas do Pós-guerra, o fato é que os trabalhos pioneiros de cientistas soviéticos permaneceram no anonimato e o mundo só viria a conhecer os nanotubos de carbono a partir do trabalho de um cientista japonês no início dos anos de 1990.

Em 1991, Sumio Iijima publica na Nature um trabalho onde reporta a formação de pequenas “agulhas” de carbono, formados por folhas concêntricas de grafite e que ele batizou de “microtubos de carbono grafítico” [5]. Obviamente o impacto foi gigantesco, afinal trata-se de uma das revistas científicas mais importantes e de maior destaque no mundo. Soma-se a isso o fato de que naquele momento havia um enorme interesse da comunidade científica pela matéria na nano escala. As técnicas de microscopia de tunelamento e de força atômica, que pela primeira vez permitiam aos cientistas manipular átomos, estavam se tornando cada vez mais acessíveis. Kroto e Smalley [6] haviam recentemente (em 1985) descoberto os fulerenos, que tornaram a pesquisa por macromoléculas de carbono um trend topic da ciência mundial (muito antes da invenção do Twitter!). De fato, Iijima estava buscando sintetizar fulerenos de carbono, e acabou encontrando nanotubos como um subproduto indesejado na sua síntese. O trabalho está entre os 100 mais citados da história e transformou Iijima em uma celebridade científica mundial como o “descobridor” dos nanotubos de carbono. A imensa maioria das publicações sobre nanotubos de carbono começam com “…desde a descoberta dos nanotubos de carbono por Iijima em 1991…”. Esse equívoco durou décadas e só começou a ser desfeito em 2006, quando a Carbon (uma das mais importantes revistas da área) publicou um editorial esclarecendo o assunto [7]. Apesar disso, até hoje inúmeros trabalhos continuam a ser publicados creditando o descobrimento dos nanotubos de carbono unicamente a Sumio Iijima. É claro que o trabalho de Iijima tem relevância do ponto científico e histórico. Iijima apresenta uma análise detalhada da estrutura atômica dos nanotubos, através de difração de elétrons, que ainda não havia sido reportada. Além disso, apresenta pela primeira vez imagens de microscopia eletrônica de alta resolução que mostram claramente os planos atômicos que formam a estrutura das paredes múltiplas dos nanotubos. Entretanto, ele não foi o primeiro a observar a formação desses pequenos “tubos” e creditar unicamente Iijima como descobridor dos nanotubos de carbono é cientificamente incorreto e historicamente injusto.

Os “microtubos de carbono grafítico” reportados por Iijima em 1991. O termo “nanotubos” seria cunhado pelo próprio Iijima alguns anos depois [5].

Grafeno – quase 200 anos de história antes do Premio Nobel de 2010

Já o grafeno tem uma história ainda mais antiga, e para chegar nele precisamos começar com o grafite. Em 1840, o cientista alemão C. Schafhaeutl estava trabalhando na purificação de amostras de ferro e aço, tentando remover o kish do ferro fundido. O kish é um subproduto da fabricação do ferro fundido, que aparece quando há um excesso de carbono no processo. Quando o metal começa a esfriar, esse carbono em excesso se precipita na superfície do metal como uma forma de grafite. Schafhaeutl notou que, ao esquentar as amostras em uma mistura de ácidos sulfúrico e nítrico, estas passavam por um enorme inchamento. O material aumentava consideravelmente seu volume, como se estivesse absorvendo os ácidos. Hoje, sabemos que o que Schafhaeutl descobriu foi um compósito por intercalação de grafite, onde ácido sulfúrico penetrou entre as camadas atômicas do grafite aumentando a distância entre as camadas e causando o “inchamento”.

Alguns anos mais tarde, em 1859, o químico inglês B. C. Brodie deu um passo a mais no estudo das propriedades do grafite aquecido em ácido sulfúrico e nítrico. Brodie descobriu que o grafite tratado adequadamente nesses ácidos, formava um novo composto de carbono-oxigênio-hidrogênio, que ele chamou de “ácido grafítico”. Esse material se cristalizava em finas lâminas, organizadas em uma estrutura de alta simetria que podia ser clivada. Brodie inclusive determinou um peso molecular para essa nova forma de carbono, 33, e sugeriu para esse novo composto o sugestivo nome de graphon [8]. Na verdade, o material produzido por Brodie foi o óxido de grafite (e provavelmente também óxido de grafeno). O óxido de grafite mantém uma estrutura grafítica (camadas de grafeno empilhadas), porém mais irregulares e espaçadas entre si, devido aos grupos funcionais [principalmente hidróxidos (OH) e ácidos carboxílicos (COOH)] que entram entre as camadas atômicas do grafite durante o tratamento em meio ácido. Se esse tratamento em ácido tiver as condições adequadas (basicamente tempo e temperatura), essas camadas de óxido de grafite podem se separar umas das outras, num processo chamado de esfoliação química do grafite, em que a estrutura grafítica se desfaz dando origem a lâminas individuais de carbono com grupos funcionais em superfície, o que chamamos hoje de óxido de grafeno. Nesses processos de tratamento ácido do grafite, o óxido de grafite e de grafeno estão em suspensão em meio líquido, em geral um meio aquoso de coloração amarelada. Quando os solventes são removidos, por filtragem ou evaporação, as partículas de óxido de grafite e de grafeno tendem a se depositar uns sobre os outros, formando lâminas que podem se manter coesas por interações de Van der Waals. Em 1918, Haenni [9] produziu os primeiros filmes finos de óxido de grafite/grafeno por filtração. Filmes extremamente finos, semelhantes a uma folha de papel, com espessura de 0,05 mm que ele chamou de “papéis de óxido de grafite”. [Um parênteses: estou fazendo referência ao óxido de grafeno porque hoje sabemos que, invariavelmente, ao oxidar e esfoliar o grafite algumas lâminas de óxido de grafeno serão geradas. Porém naquele momento histórico, não se tinha conhecimento do grafeno e nem havia condições experimentais para que lâminas de grafeno com espessura atômica fosses detectadas].

No início do século XX, a recente descoberta dos raios X por Wilhelm Rontgen estava dando origem a uma nova área da ciência: a cristalografia. Pela primeira vez, era possível determinar com precisão como os átomos de um sólido se organizavam na estrutura cristalina dos materiais a partir do padrão gerado pela difração dos raios X no seu interior. O grafite foi um dos primeiros materiais estudados na cristalografia. Um dos primeiros estudos de difração de raios X em grafite foi realizado pelos próprios ‘pais’ da cristalografia, William e Lawrence Bragg (pai e filho) em 1914 [10] (apenas um ano após haver formulado a equação que leva seu nome e que lhe renderia o prêmio Nobel de Física em 1915). Debye em 1916 [11] e Hull em 1917 [12] também fariam estudos preliminares da estrutura do grafite por raios X, mas foi somente em 1924, com o trabalho de Bernal [13] através da análise de amostras monocristalinas, que a estrutura do grafite seria determinada com precisão. Em paralelo ao avanço no estudo do grafite mineral, o interesse na oxidação do grafite e nos papéis de óxido de grafite continuava em alta na comunidade científica do início do século passado. Os filmes de óxido de grafite apresentavam algumas propriedades interessantes, sua estrutura cristalina e composição química ainda não estavam completamente esclarecidas, e chamava atenção sua capacidade de absorver água e outros líquidos polares. 

Até a primeira metade do século XX, diversas rotas experimentais eram utilizadas para a produção do óxido de grafite. De maneira geral, todas elas eram similares ao método utilizado por Brodie em 1859. Envolviam o uso de ácidos concentrados e altas temperaturas, sendo perigosas, demoradas e com baixo rendimento final. Em 1958, em um artigo de apenas uma página, Hummers e Offeman [14] propuseram um procedimento que era mais seguro, rápido e eficiente na produção do óxido de grafite. O processo ficou conhecido como o “método de Hummers” e, com algumas modificações, acabou se tornando o método padrão para obtenção de óxido de grafite e posteriormente, óxido de grafeno, sendo utilizado até os dias atuais.

Sistema cristalino hexagonal, proposto para o grafite por Hull em 1917 e confirmada por Bernal em 1924 por difração de raios X. Os átomos de carbono estão dispostos em hexágonos, formando planos paralelos que podem ser facilmente clivados [13].

O avanço no conhecimento experimental da estrutura e propriedades do grafite e do óxido de grafite, foi acompanhado do avanço na modelização teórica do grafite e seus derivados. Em 1947, surge o primeiro modelo para a estrutura eletrônica e o transporte de elétrons em uma lâmina (teórica) de grafeno. P. R. Wallace, físico teórico canadense, estudou o comportamento eletrônico do grafite para determinar como seria a condução de eletricidade em uma hipotética “monocamada de grafite” [15] (note-se que nesse momento, a palavra “grafeno” ainda não existia!). Portanto, na primeira metade do século XX já conhecíamos a estrutura do grafite, formada por camadas empilhadas de átomos de carbono conectados entre si em um padrão hexagonal. Tínhamos inclusive informação de qual era a distância entre as camadas a partir dos dados de difração de raios X. Sabíamos que podíamos inserir átomos e moléculas entre essas camadas, através da oxidação do grafite em meio ácido, formando compostos de intercalação. Também sabíamos que essas camadas poderiam ser separadas (esfoliadas), em finas lâminas cristalinas que podiam ser depositadas na forma de um filme. Além disso, conhecíamos a teoria do mecanismo de condução elétrica do grafite e também para uma hipotética monocamada atômica de grafite (grafeno). Faltava uma imagem do grafeno, faltava que o grafeno fosse “visto”.

A observação experimental daquilo que viria a ser conhecido como grafeno, só aconteceu no início dos anos 60. Em parte pela pouca definição e capacidade de imagem dos primeiros microscópios eletrônicos (desenvolvidos nos anos 1930), e em parte pela dificuldade de se produzirem laminas de grafite suficientemente finas para observação.

Em 1962, H. P. Boehm e colegas publicam um trabalho em um evento dedicado a pesquisas com carbono, onde estudam as propriedades de superfície de folhas de carbono “extremamente finas”. Nesse trabalho [16], apresentam imagens de microscopia eletrônica de lâminas finas de carbono, obtidas a partir do rápido aquecimento do óxido de grafite a 180 ˚C. Boehm relata através desse processo a obtenção de um tipo de “fuligem de óxido de grafite”, muito volumosa e “fluffy”. Essa fuligem era composta por folhas de carbono extremamente finas. Uma dessas folhas observadas por Boehm é apresentada na imagem abaixo, provavelmente a primeira observação experimental de uma lâmina de grafeno, ou de algumas poucas lâminas de grafeno.

Imagem de trabalho publicado por H. P. Boehm, em 1962. Possivelmente a primeira observação de grafeno por microscopia. As regiões mais finas apresentam espessura da ordem de 4 Å. Nas palavras dos próprios autores, “pode-se expressar, com cautela, que a espessura dos filmes corresponde a umas poucas camadas atômicas” [16].

Ao aquecer rapidamente o óxido de grafite, os átomos de oxigênio se desprendem e saem da estrutura, deixando pra trás finas e esburacadas folhas bidimensionais de carbono, o que hoje conhecemos como óxido de grafeno reduzido. O material obtido por Boehm após o tratamento térmico apresentava área superficial específica de 1200 m2/g, o que corresponde a uma espessura entre 2 e 3 camadas atômicas. O trabalho de Boehm é extremamente interessante, escrito com uma linguagem clara e objetiva, riquíssimo em detalhes experimentais e deveria ser leitura obrigatória para qualquer estudante ou profissional interessado em ciência dos materiais. Boehm ainda teve um outro papel importante na história do grafeno. Foi ele quem sugeriu à IUPAC (União Internacional de Química Pura e Aplicada) a formalização da nomenclatura “grafeno” em 1994 [17], para a “camada atômica individual de átomos de carbono originada do grafite e organizada em uma estrutura hexagonal”.

Nas décadas seguintes, outros trabalhos mostraram a observação de lâminas de grafeno, obtidos por técnicas variadas e com imagens de qualidade significativamente melhoradas. Mas em geral, estes trabalhos se resumiram à observação de novas imagens do grafeno em melhor qualidade, até Geim e Novoselov em 2004 [18]. No trabalho publicado na Science, pela primeira vez foram intencionalmente isoladas folhas de grafeno, suficientemente grandes para permitir a caracterização de algumas de suas propriedades física e químicas. Apesar de o trabalho ficar conhecido do público em geral por causa do método simples e direto utilizado para gerar as lâminas de grafeno, que a princípio pode ser facilmente replicado por qualquer pessoa com um pedaço de grafite de lápis e fita adesiva, não foi isso que deu aos autores o prêmio Nobel de física em 2010. Nas palavras do próprio Geim, “não foram as lâminas de grafeno ou as imagens de microscopia que chamaram a atenção dos pesquisadores, mas suas propriedades eletrônicas” [19]. Geim, Novoselov (e outros 6 autores diga-se de passagem), não apenas isolaram lâminas de grafeno de apenas 1 camada atômica de espessura mas aplicaram esse grafeno na fabricação de dispositivos, mediram sua condutividade elétrica, sua capacidade de transportar cargas em função da temperatura e criaram modelos para explicar os dados experimentais obtidos.

Uma folha de grafeno obtido por Geim e Novoselov observada por microscopia de força atômica. A imagem tem 3 x 3 µm2 e a espessura da lâmina é da ordem de 4 Å. Reproduzido de [18].

Folha de grafeno apoiada sobre dois contatos elétricos em um dos dispositivos montados por Geim e Novoselov para medidas das propriedades eletrônicas do grafeno. Reproduzido de [18].

O trabalho de Geim e Novoselov pode ser considerado como ponto de partida para o desenvolvimento de muito do que se faz hoje em nanotecnologia, nas mais diversas áreas. A partir do trabalho publicado em 2004, e com mais intensidade a partir do premio Nobel de 2010, o interesse pelo grafeno explodiu na comunidade científica. O grafeno encontra potencial aplicação em praticamente todos os setores da indústria. Existem grandes empresas investindo em grafeno, milhares de startups desenvolvendo ideias com grafeno, e outros tantos grupos de pesquisa em universidades estudando e descobrindo diariamente novas propriedades do grafeno. O trabalho de Geim e Novoselov abriu novas rotas para o futuro do grafeno, a partir de um caminho que começou a ser trilhado há quase 200 anos atrás.

Referências

  1. Radushkevich, L.V., Lukyanovich, V.M. O strukture ugleroda, obrazujucegosja pri termiceskom razlozenii okisi ugleroda na zeleznom kontakte. Zurn Fisic Chim, 1952. 26: p. 88–95.
  2. Hillert, M., Lange, N. The structure of graphite filaments. Zeitschrift fur Kristallographie,  1958, Bd 111, S. 24-34.
  3. Katz, E. A. Credit to pioneering work on carbon nanotubes. International Journal of Nanomaterials, Nanotechnology and Nanomedicine, 2021. 7: p. 043-044.
  4. Nesterenko, A. M., Kolesnik, N. F., Akhmatov, Yu. S., Suhomlin, V. I., Prilutskii, O. V. Osobennosti fazovogo sostava i struktury produktov vzaimodeistviya NiO i Fe2O3 s okis’yu ugleroda. Izvestia Akademii Nauk SSSR, Seriya Metally, 1982. 3: p. 12-17.
  5. Iijima, S., Helical microtubules of graphitic carbon. Nature, 1991. 354: p. 56–58.
  6. Kroto, H. W., Heath, J. R., O’Brien S. C., Curl, R. F., Smalley, R. E. C60: Buckminsterfullerene. Nature, 1985, 318: p. 162-163.
  7. Marc, M., Vladimir, L.K. Guest Editorial Who should be given the credit for the discovery of carbon nanotubes? Carbon, 2006. 44(9): p. 1621–1623.
  8. Brodie, B. C., On the atomic weight of graphite. Royal Society of London, 1858. 149: p. 423-429.
  9. Haenni, P., Kohischütter, V. Zur Kenntnis des Graphitischen Kohlenstoffs und der Graphitsäure. Zeitschrift für anorganische und allgemeine Chemie, 1918.
  10. Bragg, W. H., Bragg, W. L. X rays and crystal structure. 4th edição, 1924.
  11. Debye, P., Scherrer, P., Interferenzen an regellos orientierten Teilchen im Röntgenlicht. Physikalische Zeitschrift (in German), 1916. 17: p. 277-292.
  12. Hull, A. W. A new method of X-ray crystal analysis. Physical Review, 1917. 10, p. 661-697.
  13. Bernal, J. D. The structure of graphite. Proceedings of the Royal Society A: mathematical, Physical and Engineering Sciences, 1924. 106, p. 749-773.
  14. Hummers, W. S., Offeman, R. E. Preparation of graphitic oxide. J. Am. Chem. Soc., 1958. 80, 6, p.1339.
  15. Wallace, P. R., The Band Theory of Graphite. Physical Review, 1947. 71(9): p. 622–634.
  16. Boehn, H. P., Clauss, A., Fischer, G., Hofmann, U. Surface properties of extremely thin graphite lamellae. Proceeding of the Fifth Conference on Carbon, 1962. p. 73-80. 1962
  17. Boehm, H. P., Setton, R., Stumpp, E. Nomenclature and terminology of graphite intercalation compounds. IUPAC recommendations 1994. Pure & Appl. Chem, 1994. 66, p. 1893-1901.
  18. Novoselov, K. S., Geim, A. K., Morozov, S. V., Jiang, D., Zhang, Y., Dubonos, S. V., Grigorieva, I. V., Firsov, A. A. Electric field effect in atomically thin carbon films. Science, 2004. 306, p. 666-669.
  19. Geim, A. K. Graphene prehistory. Phys. Scr., 2012. p. 014003.

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